segunda-feira, 28 de abril de 2008

Ecologia do Rio Paraná

Na porção do estado do Paraná separada do estado do Mato Grosso do Sul encontramos um dos maiores rios em extensão nessa porção da América Latina: o rio Paraná (figura 1). Seguindo o curso do rio vamos encontrar no lado paranaense as cidades de Porto Rico e São Pedro, onde concentraremos os dados aqui informados. Nessa região encontramos uma ampla área utilizada por fazendeiros e ribeirinhos, mas que constitui uma Área de Preservação Ambiental (APA), onde existem grandes divergências pelo domínio da terra e conservação da biodiversidade.
Uma planície alagável é uma região onde o regime de cheias do rio, provocado pelas chuvas que aumentam o nível da água do corpo d'-água e os limites do período de seca na planície, geralmente ocupado por gramíneas e pequenos arbustos, e essa água toda extravasa para as margens e toda a planície fica coberta por alguns meses, até que as águas baixem e a vegetação ocupe novamente essa região.
No alto rio Paraná identificamos em um corte do terreno alguns limites originados em tempos geológicos anteriores, devido a deposição de sedimentos sobre o arenito (Arenito Caiuá). O movimento de intrusão do rio se dá no sentido MS-PR, ou seja, o mesmo movimento de deposição de materiais no passado continua a ocorrer no presente, ocorrendo um desgaste do paredão no lado paranaense e uma lixiviação desse material que se deposita na outra margem do rio. Se observa que ao longo dos últimos dez anos de pesquisa, os degraus existentes no curso do rio vem se mostrando de profundidades menores a cada amostragem e mensuração refeitas. Ao longo de alguns milhões de anos, o rio terá uma nova região de intrusão, cada vez mais para o interior do Paraná.
Esse movimento das águas é importantíssimo para a biodiversidade local e a renovação da biota ali existente. O subir e descer das águas determina a morte da vegetação e a migração das populações terrestres da área de várzea (que fica debaixo da água na cheia), garante a sobrevivência de grande número de espécies de peixes que desovam nesse período nas lagoas isoladas nas temporadas de águas baixas, que são unidas ao rio do período de cheiase a fertilidade do solo das margens da planície, composta por gramíneas, principalmente, sem grande quantidade de biomassa disponível para aumento da quantidade de matéria orgânica para formação de húmus.

Perfil do terreno e da vegetação da região

Na figura 2, observamos um corte transversal do terreno no sentido MS-PR. As áreas numeradas indicam o escalonamento existente no perfil, com as partes mais altas na periferia do lado matogrossense, na formação Taquaruçu, e no lado paranaense, onde o arenito Caiuá se deposita sobre o basalto. Em 1 predominam as formas arbóreas de palmeiras, que não formam um dossel contínuo. Encontramos principalmente (mas observe que nem todas as formas vegetativas aqui citadas sao palmeiras, dada a diversidade local) a embaúba, ingás e tucuns (palmeira espinhenta), estas últimas em campos abertos, formando touceiras.
Mais abaixo (em 2) predominam árvores intermediárias, de porte não menos vigoroso, mas que tendem a se aproximar das espécies com adaptações para o alagamento. Já em 3, na planície alagável, predominam as gramíneas e pequenos arbustos, geralmente Cyperaceae, pioneiras de colonização. Este último estrato é denominado ripário (todo tipo de forma vegetativa floral que se estabelece em torno de corpos d'-água). Outro tipo de vegetação ripária é a mata ciliar, que nesse ambiente tem como principais representantes a embaúba, adaptada à elevação do nível da água, os ingás, o amarelinho (estes dois últimos Leguminoseae), lianas, que são muito freqüentes em ambientes alagáveis ou perturbados, e epífitas, principalmente as do grupo das bromélias. Aparecem limoeiros e mangueiras, espécies introduzidas na passagem dos jesuítas pela região.
A porção 4 é o rio Paraná. Sua extensão é cortada por ilhas, o que o faz um rio anastomosado tendendo a entrelaçado. São observadas manchas de macrófitas (plantas aquáticas) de diversas espécies e com diferentes adaptações: Cabomba, completamente submersa, Hydrilla, uma espécie asiática introduzida, Eichhornia, os conhecidos aguapés, Nymphaea, Salvinia, esta última completamente flutuante, com uma pequena porção de suas folhas modificadas para a retirada de nutrientes minerais da água.
Do lado paranaense, aparece a formação Caiuá. Se no Mato Grosso do Sul o predomínio vegetativo é da floresta semidecidual aluvial, com adaptações para a cheia do rio Paraná sobre a formaçaõ Caiuá no Paraná predomina a floresta estacional semidecidual, com árvores mais baixas em relação às demais existentes na periferia da formação. Formam um dossel espesso e a vegetação é bastante umbrófila, dada a dificuldade de penetração dos raios solares através do dossel. Perobas, ingas, genipapos, formigueiros, mirtáceas, rubiáceas, leguminosas são espécies tipo encontradas. As figueiras alcançam o alto do dossel, e suas raízes tabulares formam um entrelaçado que dá a impressão de serem um único indivíduo reproduzido por rizomas.

A fauna da planície

Para quem se detém a observar os sons da mata vai perceber que os animais nela existentes são em número muito grande. Comecemos pelos habitantes das águas do rio Paraná, que habitam desde a profundidade do rio por toda sua extensão, até as lagoas que formam os corpos d´-água no interior das ilhas, ou ladeando os diques marginais, onde a floresta é abundante. Comunidades tem proteção, abrigo e alimentos oferecidos pelo emaranhado de macráfitas que ocupam o rio, formando manchas, e criando um ambiente ideal para a sobrevivência dos peixes. Agostinho et al (2004) apontam a existência de 176 espécies registradas de peixes, dos quais se destacam curimbas, dourados, pintados, piracanjuba, 2 espécies de piranhas, piau.
Diversas espécies de anfíbios, répteis, aves e mamíferos são divisados na mata. Encontram-se 58 famílias de pássaros, 60 espécies de vertebrados, estes últimos categorizados em 25 famílias, uma série de nematóides, gastrópodes e ostrácodas. Nos afluentes do Paraná, como no rio Baía, com suas águas negras, espécies de raias de água doce podem ser vistas em banhos de sol, enquanto se navega em direcao ao MS. Já na mata, são registrados o aparecimento de onças, cachorros-do-mato, tapires, veados mateiros e os conhecidos porcos-do-mato, que atacam sempre em bandos.

O rio Paraná

O rio Paraná tem uma extensão de aproximadamente 4000 Km (a literatura fala em 3998 Km). É o nono rio em extensão mundial, muito próximo de rios como o Mississipi, na América do Norte, e o Ganges, asiático. Em sua foz são liberados aproximadamente 16.000 m³ a cada segundo. Se considerarmos que uma pessoa leve 5 segundos para um reflexo respiratório total (inspiração e expiração), a cada vez que essa pessoa respira, 800.000 litros de água são liberados pelo rio Paraná. O pôr-do-sol na cidade de Porto Rico leva quase cinco minutos para ocorrer totalmente (o sol leva 5 minutos para desaparecer no horizonte, quando já está baixo). Se você estiver parado em frente ao rio para observar esse fenômeno belíssimo oferecido pela gratuidade da natureza, provavelmente terão passado por você 48 milhões de litros de água, que chegarão ao oceano Atlântico na desembocadura na Argentina, muito além do Uruguai.
De área navegável temos aproximadamente 1.740 km (43,52%). A totalidade da extensão está impedida por barragens, como a de Porto Primavera, no estado de SP, e Itaipu, no PR. A pesca ocorre em diversas localidades, e o lazer é ofertado por diversas empresas que prestam serviço de canoagem, turismo e mergulho.

Os impactos ambientais

De longe as construções de barragens são o maior causador de degradação para essa região. Esses reservatórios impedem que a vazão natural seja mantida, diminuindo seu fluxo em até 70% [para qualquer curso d´-água, segundo Tundisi, (2003)]. As chamadas escadas de peixes são um segundo obstáculo, acoplado às barragens, criadas para que os peixes migradores possam subir sem atravessar a barragem pelo centro e possam desovar nas lagoas ao longo do curso dos rios; isso nem sempre acontece. Com o impedimento da vazão natural, as cheias que promovem a renovação da biodiversidade e a reprodução de várias espécies não ocorre de forma natural. Os reservatórios podem ter as comportas fechadas se o nível da água estiver baixo e serem abertas se os níveis forem altos. Para os peixes migradores, que acompanham a correnteza rio acima, e que desovam nas lagoas, muitas vezes essa mudança nos níveis das águas impedem a desova, ou o desenvolvimento da prole, ou mesmo seu retorno (como o dos pais) rio abaixo. A mortalidade é muito alta nesses casos.
As áreas utilizadas no cultivo e para pastagens são um terceiro fator de impacto. A mata é muitas vezes dizimada para a abertura de campos de pastagens, o uso de fertilizantes e pesticidas acaba por poluir as águas e contribui com a morte de diversas espécies de peixes e com o processo de eutrofização, pelo aumento da quantidade de matéria orgânica disponível para as macrófitas. Com a dificuldade de penetração da luz solar no corpo d´-agua, a fotossíntese nas plantas submersas se torna improvável, os peixes e organismos aquáticos não têm de onde obter oxigênio e acabam morrendo.
Como as áreas de campos no primeiro domínio da planície é coberto por gramíneas e pequenos arbustos, e como as demais áreas são cobertas por vegetação espessa, não é raro a ocorrência de queimadas devidas a diversos fatores. No período de vazante do rio, em que as cheias já regrediram e o nível do rio permanece por vários meses baixo, não há limitantes na contenção de qualquer rastro de fogo que se alastre por pequena parcela da vegetação. Os estragos são sempre muito grandes.

É nosso, então vamos cuidar

Já parou para pensar em como você perde horas cuidando do que é seu? A natureza é uma parte dessa ecologia. A ecologia que vem da "casa" grega, uma casa que inspira cuidados e proteção para se manter para as gerações que virão. Cuide do que é seu!

Referências

AGOSTINHO, A. A; THOMAZ, S. M.; GOMES, L. C. Threats for biodiversity in the floodplain of the Upper Paraná River: effects of hydrological regulation by dams. Ecohydrol and Hydrobiol v. 4, n. 3, 267-280, 2004

TUNDISI, J. G. Água no século XXI: enfrentando a escassez. Sao Carlos: RiMa, IIE, 2003.

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